“NÃO TEM ALTURA O SILÊNCIO DAS PEDRAS”: A PRIMEIRA INFÂNCIA NO DISCURSO DO UNICEF

Nome: ALINE ELISA MARETTO LANG FONSECA

Data de publicação: 10/07/2025

Banca:

Nomeordem decrescente Papel
CAMILA POTYARA PEREIRA Examinador Externo
JULIANA IGLESIAS MELIM Examinador Interno
MARCIA SMARZARO SIQUEIRA Examinador Interno
MARIA LUCIA TEIXEIRA GARCIA Presidente
VERA MARIA RIBEIRO NOGUEIRA Examinador Externo

Resumo: Esta tese examina os discursos do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) sobre a
primeira infância, que, sob a aparência da igualdade de direitos, impõem tratamentos desiguais
às crianças em diferentes nações. Analisamos a presença da primeira infância nas agendas
internacionais como estratégia discursiva e política de combate à pobreza adotada pelo
UNICEF, demonstrando porque ela assume formas distintas conforme o contexto
socioeconômico. O estudo apoia-se no materialismo histórico-dialético e em abordagem
qualitativa. O corpus reúne 104 documentos do UNICEF (1972-2023) submetidos à análise de
conteúdo temática focadas em conteúdo-chave, estratégia discursiva e silêncios. Verificou-se
que a primeira infância aparece nos Relatórios Anuais de 1973, ligada a nutrição, água potável
e educação básica. Em 1978, impulsionada pela Conferência de Alma-Ata e pelo pacote GOBI,
a primeira infância torna-se pauta permanente, sinalizando a passagem de ações pontuais de
sobrevivência para uma agenda global estruturada. A perspectiva da agência varia segundo o
cenário econômico: nos anos 1980, sob o lema ajuste com rosto humano, a Atenção Primária
integral é reduzida a intervenções de baixo custo; na década seguinte, com a virada neoliberal,
surge a gramática dos direitos (Convenção de 1989) e, logo depois, o paradigma do capital
humano e do investimento social. Entre 2000 e 2015, essa lógica é reempacotada pelos
ODM/ODS, que combina métricas de custo-efetividade com a promessa de alto retorno
econômico. Nas orientações, países centrais recebem recomendações de expansão de serviços
universais e igualdade de gênero, enquanto periferias são alvo de pacotes focalizados de baixo
custo baseados em indicadores de retorno do investimento. A retórica da eficiência, que supõe
maior retorno futuro, reforça a seletividade e a dependência periférica. Embora evoque a
Convenção sobre os Direitos da Criança, o UNICEF subordina direitos a métricas de
produtividade e transfere a famílias – sobretudo mulheres – a responsabilidade pelo êxito das
intervenções. O léxico institucional muda conforme a conjuntura, mas mantém a legitimação
da ordem social: nos anos 1970-80 prevalecem serviços básicos/ajuste com rosto humano; nos
1990-2000, capital humano/investimento social; após 2008 surge a resiliência; desde 2018,
esses enunciados convergem no Nurturing Care Framework, referência para os ODS e seus
cinco pilares (saúde, nutrição, cuidado responsivo, aprendizagem precoce, proteção). Esta
trajetória confirma o caráter adaptativo, persistente e estrategicamente seletivo do léxico
institucional. Em todas as fases, argumentos neurocientíficos e análises de custo-benefício
transformam cuidado e afeto em ativos de mercado, aprofundando a financeirização da
reprodução social. Conclui-se que o discurso universalista do UNICEF opera como engrenagem
ideológica do capital: legitima políticas focalizadas nos países periféricos, preservando
hierarquias, embora permita conquistas pontuais de direitos. Ao articular primeira infância e
investimento social sob olhar crítico, esta pesquisa preenche lacuna acadêmica e oferece
subsídios para políticas verdadeiramente universais e socialmente justas, reposicionando a
infância nas estratégias de desenvolvimento.

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